Jovens indígenas de Roraima estreiam caravana “Vem Remar Comigo” para fortalecer e continuar a luta das lideranças tradicionais

Motivados a fortalecer e continuar a luta das lideranças tradicionais, 25 jovens indígenas indicados por duas lideranças, estiveram nos últimos dias, 5 a 8, em três comunidades e regiões, Serra da Moça (Murupu), Pium (Tabaio) e Homologação (Baixo Cotingo), compondo a caravana “ Vem Remar Comigo”, tema inspirado no líder indígena Waldir Tobias que, incisivamente, chama a juventude para “ remar o barco”, o que significa continuar a luta do movimento indígena de Roraima.

A Caravana é uma iniciativa do departamento Jurídico e do Núcleo da Juventude do Conselho Indígena de Roraima (CIR). Estiveram na coordenação e organização da caravana, os coordenadores do Núcleo, Raquel Wapichana e Messias Macuxi, além das estudantes de direito, que atuam no departamento Jurídico, Carla Jarraira e Zuli Kaimen.

Comunidade Indíegana Serra da Moça, Região Murupu

A missão é dar continuidade à luta das lideranças, que construíram o movimento indígena de Roraima, um movimento de mais de 50 anos, segundo a coordenadora Raquel. Ela acredita que a caravana serviu para fortalecer cada vez mais os jovens.
“ Vem Remar Comigo, o tema da caravana foi idealizado e inspirado no líder Waldir Tobias, que sempre pede para a juventude. ‘Vamos entrar no barco com a gente, vamos continuar remando’ , ele nos chama para a luta e hoje estamos aqui para dar continuidade. E nesta experiência pudemos reencontrar antigas e novas lideranças. Acredito que todos se sentiram fortalecidos”, ressaltou Wapichana.

O encontro e reencontro com as antigas e novas lideranças, marcou a estreia da caravana nos territórios. A emoção, a alegria e a curiosidade, era nítido no semblante dos jovens, como da jovem Júlia Wapichana, que saiu da sua comunidade Araçá, região Amajari e percorreu três regiões. Júlia é atuante no movimento indígena de Roraima, sempre acompanha as atividades da sua região e quando tem mobilização, ela é uma das jovens da linha de frente.
Participando da caravana, ela contou como foi a experiência. “Foi uma experiência intensa para gente que está apenas começando a caminhada, porque fomos nas comunidades Serra da Moça e vimos projetos. Na comunidade Tabaio a emoção de ver as consequências das lutas, pois como já disseram, somos a fruta que nossas lideranças plantaram. Com seu Nelino Galé foi incrível, pois a forma que ele explicou sorrindo, mas sempre com palavras fortes”, contou.

A resistência é um perfil forte das comunidades indígenas, como foi visto na comunidade Serra da Moça. Cercada pelos empreendimentos de soja, fazendas, mas mantém a barragem de água natural das serras, uma fonte utilizada para também manter a plantação. A barragem foi construída na década de 1980, segundo moradores.

Comunidade Indígena Serra da Moça – Foto 1. Visita a equipe de Brigadistas Indígenas e Prevfog/  Fotos 2-3, Visita a Barragem

A caravana também proporcionou aos jovens, um momento de fortalecimento cultural com as canções do cantor e compositor Celestino Andrade, 73 anos, do povo Macuxi. Autor da canção mais conhecida do seu rico e diverso repertório “ Panela de Barro”, Celestino causou emoção ao contar sua trajetória desde a luta pela terra indígena Raposa Serra do Sol, até os dias atuais, com vários desafios nos territórios indígenas.
Defensor do meio ambiente e dos recursos naturais, Andrade trava uma batalha pela preservação do Pau-rainha, árvore nativa e quase extinta, além dos animais e pássaros, utilizados como fonte de inspiração para suas canções. Nas canções, Celestino costuma compor sobre a caminhada, as dores, e a resistência do povo, para que jamais sejam esquecidos.

Comunidade Indígena Pium – Região Tabaio

Acompanhados pelos moradores, os jovens visitaram a área da Terra Sagrada, na região do Tabaio. Protegido pelas mulheres, o local é marcado pelo conflito, em 2021, quando parte das famílias tiveram que ser expulsas, além de terem casas queimadas, destruição de nascentes e morte de animais.
A região possui águas cristalinas e plantas medicinais que mantiveram a saúde das famílias, durante o período da convida-19.
Madalena da Silva e Nadi da Silva estavam no local durante a invasão e contaram que, além das ameaças constantes, lideranças não podem mais pisar na área por conta das ameaças.

“O trator veio, estávamos fazendo café, eles ficaram de longe, e logo disseram para sair. Eu disse, não vou sair, não estou fazendo nada de mais na terra, só estou morando, esta terra é nossa e vocês vêm assim, venham, eu disse a eles, estamos fazendo café. Por que estão fazendo isso, estão com medo?”, relembrou Nadi.

Terra Sagrada, Comunidade indígena Pium – Região Tabaio

Emocionada, relembrou aos jovens a importância da defesa do território, deixando também aos acadêmicos em Direito, Jornalismo e Gestão Territorial o compromisso de lutarem junto aos mais antigos por seus direitos. “Derrubaram as casas, mas não vou desistir, não vou entregar a Terra Sagrada”.
A última parada foi feita na comunidade indígena Homologação, região Baixo Cotingo, na terra indígena Raposa Serra do Sol. Recepcionado pelo líder Nelino Galé, os jovens também ouviram a memória dos primeiros passos do movimento indígena e da organização CIR, Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).

“Foi uma visita muito especial para mim, não esperava que seria assim, felizmente chegaram para me ouvir, para ouvi-los também. Passar os nossos conhecimentos da luta da nossa conquista. Passei o nosso início, da nossa trajetória. Os primeiros passos da nossa organização e coordenadores, a organização da saúde, educação e política. Foi ótimo, espero que tenha inspirado a eles continuarem”, destacou Nelino.
Segundo os organizadores, contará com novas edições, levando consigo o objetivo de valorizar, preservar e discutir entre lideranças tradicionais e jovens indígenas, como criaram o movimento indígena, e os desafios atuais e futuros.

Além dos jovens das regiões, a caravana contou com a participação de estudantes dos cursos de direito, jornalismo, gestão territorial e saúde coletiva indígena, da Universidade Federal de Roraima (UFRR).

Comunidade Indígena Homologação – Foto 1, Nelino Galé.