CIR recebe visita de magistrados federais e propicia um novo olhar sobre os povos indígenas

O tradicional auditório Lindalva Macuxi, do Conselho Indígena de Roraima (CIR), mais uma vez fez histórica. Nesta manhã (23), a organização recebeu a visita de magistrados federais de várias regiões do Brasil, incluindo de Roraima, que durante três dias participaram do I Simpósio de Pessoas e Povos Indígenas, realizado em Boa Vista.

Encerrando as atividades do Simpósio com a visita, o evento buscou compartilhar conhecimentos científicos e saberes tradicionais dos povos indígenas. Durante a visita, o advogado indígena e coordenador do departamento Jurídico do CIR, Junior Nicácio, fez uma breve apresentação da organização junto às comunidades indígenas de Roraima.

Nicácio apresentou a atuação histórica dos seus nove departamentos: Jurídico, Comunicação, Ambiental e Territorial, Administrativo, o sistema de governança territorial, com o Protocolo de Consulta, Regimento Interno, Plano de Gestão Territorial e Ambiental (PGTAs), os atores que atuam nas bases, Agente Territorial Indígena (ATAI), Grupo de Proteção e Vigilância Territorial Indígena (GPVITI), brigadistas, comunicadores indígenas, operadores de direito, além das linhas de atuação na defesa e proteção de direitos indígenas, bem viver e segurança alimentar, mulheres indígenas e juventude na formação de novas lideranças.

Juizes e lideranças indígenas durante a visita a sede do CIR

Para apresentar uma das importantes atuações do CIR na área de gestão ambiental, territorial, e fortalecimento da autonomia e organização social, também exibiram vídeos sobre a construção dos PGTAs e Regimentos Internos. A coordenadora do Departamento de Gestão Territorial Indígena (DGTA), Sineia Bezerra do Vale, setor responsável em auxiliar a construção, reforçou sobre essa ação que ocorre desde 2011.

“Os PGTAs são os planos de vida dos povos indígenas. Cada terra indígena, cada região, tem seu plano, foi desafiador, mas, nós conseguimos, em 10 dias com as comunidades conseguimos fazer os últimos planos que faltavam, as regiões Amajari, Tabaio e Truaru”, reforçou a coordenadora que, com a comitiva de três mulheres indígenas, participará da Conferência de Mudanças Climáticas (COP-28), em Dubai.

O funcionamento do sistema de Justiça, por meio do regimento interno das comunidades, também foi abordado.  Um dos pontos destacados foram os desafios enfrentados pelo CIR em relação ao acesso à justiça, como a demarcação dos territórios indígenas, o reconhecimento dos sistemas jurídicos indígenas e a reparação dos direitos violados.

O coordenador geral do CIR, Edinho Batista, reforçou que a instituição é referência no Brasil e no mundo, na luta pela garantia dos direitos dos povos originários. E mais uma vez protagoniza um momento importante com a visita dos juízes, o que firma de fato a construção do elo entre a justiça e os povos indígenas.

“Hoje a gente traz a justiça para dentro da nossa casa, no intuito de criar essa relação de poder fazer o entendimento de que os povos indígenas têm que ser tratados de forma diferenciada nos processos que ocorrem no âmbito justiça, mas, o mais importante é que eles ouviram as experiências que nós temos de fazer a justiça dentro das nossas comunidades de acordo com nosso regimento interno e os Protocolos”.

Os juízes ressaltaram a importância do Simpósio e agradeceram ao CIR pelo compartilhamento de informações. Para o juiz da 1ª vara federal Maurício Mendonça, recém-chegado ao estado de Roraima, a experiência trouxe um novo olhar não apenas para sua vida pessoal, mas também para atuação no judiciário que envolve as causas indígenas.

 

Coordenador Edinho entrega feixe de Varas, Assessor Jurídico do CIR Junior Nicacio realiza apresentação

“Esse simpósio foi importante para entender de fato as demandas dos povos indígenas, escutar deles suas necessidades, porque eu já ouvi várias vezes outras pessoas falando por eles. E hoje vejo o indígena se expressar e conhecer sua realidade de perto por meio dessas experiências, mudou muito minha visão sobre os povos e as pessoas indígenas. 

O I Simpósio de pessoas e povos indígenas, realizado pelo núcleo da Justiça Federal, com outras instituições do judiciário, foi um sucesso e será levado para outros estados da federação, promovendo o diálogo entre os povos indígenas e o sistema judiciário. Para Erivaldo Ribeiro dos Santos, juiz auxiliar da Corregedoria Geral e juiz federal da 4ª Região, o I Simpósio marca o encontro importante entre a justiça e os povos indígenas de Roraima.

“Uma troca de experiências, um aprendizado importante por conhecer melhor, por ouvir e compreender costumes, anseios, receios e conselhos vindo das comunidades indígenas. Algumas coisas que nós não compreendemos a razão de ser, foram bem esclarecidas, por exemplo, o porquê as comunidades prezam pelo seu sistema de solução de conflitos, isso eu achei importante e marcou o evento”, ressaltou o Juiz.

Um encaminhamento será produzido com todas as informações e demandas apresentadas durante os dias de oficinas práticas, que servirão de bases para nortear os trabalhos do judiciário. Um dos destaques, segundo Erivaldo, é com relação aos laudos antropológicos e intérpretes nas repartições da justiça.

 “O laudo antropológico deve ser feito com quesitos conforme a realidade da comunidade indígenas, e nós vimos que estávamos fazendo ao contrário daquilo que deveria de fato ser perguntado. O outro tema importante é a questão do intérprete, que não é só questão de formalismo, nós temos além da língua materna, temos a cultura e nem sempre o intérprete conhece a cultura da pessoa, com um processo na justiça, e isso pode atrapalhar os resultados, ressaltou Erivaldo.

Erivaldo Ribeiro e a juíza auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Lívia Cristina Marques, receberam homenagens. Ribeiro recebeu do coordenador geral do CIR, Edinho Batista, o feixe de vara, símbolo de união e resistência dos povos indígenas, e Lívia, da secretária do Movimento de Mulheres Indígena, Kelliane Wapichana, um cocar e brincos feitos pelas mulheres indígenas de Roraima, como gesto de luta, resistência e ancestralidade.