Seminário discute estratégias para a pecuária indígena sustentável na Raposa Serra do Sol

A troca de saberes e a definição de estratégias para o futuro da pecuária indígena e sua sustentabilidade foram os eixos principais do seminário realizado entre os dias 16 e 18 de março na Terra Indígena Raposa Serra do Sol (TIRSS), em Roraima. O segundo encontro “Pecuária Indígena Sustentável” ocorreu no Lago Caracaranã e reuniu lideranças de mais de 200 comunidades de diversas regiões do estado.

Organizado pelo projeto Bem-Viver, o seminário possibilitou que os indígenas trocassem experiências e recebessem orientações para o manejo de gado e cavalo em ambientes naturais. A atividade foi anterior ao fechamento das comunidades indígenas da TIRSS por conta da pandemia do novo coronavírus.

Palestraram no evento pesquisadores da Embrapa de Roraima e do Mato Grosso do Sul, um produtor rural do Pantanal do MS, e o Padre Giorgio Dal Ben, que, juntamente com lideranças indígenas de Roraima ajudou (em 1980) na implantação do projeto “MCruz – Uma Vaca Para o Índio”. Além deles, estavam presentes ainda dois indígenas do povo Kadiwéu, que habita a região de fronteira entre MS, Bolívia e Paraguai, cujo interesse na pecuária remonta a história dos seus ancestrais Guaicurus (Indíos Cavaleiros do Pantanal).

Ao longo do primeiro dia do seminário foram apresentados os detalhes do projeto Bem-Viver que até 2022 deve auxiliar as comunidades da TIRSS a tornar a pecuária mais lucrativa e ambientalmente sustentável. O projeto Bem-Viver, que começou em 2019, é promovido pelo Instituto de Internacional de Educação do Brasil (IEB), Nature and Culture International (NCI) e o Conselho Indígena de Roraima (CIR). A iniciativa é financiada pela Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) e pela NCI.

No primeiro dia do encontro palestraram o padre Giorgio Dal Ben, que ressaltou a pecuária indígena como forma de garantir segurança alimentar, independência financeira e defesa territorial da TIRSS. E em seguida, o veterinário e professor da Universidade Católica Dom Bosco-MS, Heitor Herrera, que compartilhou sua experiência como produtor rural no Pantanal em um antigo retiro de colonos que desde 1900 trabalha com a pecuária nas pastagens nativas. No ano passado, ele recebeu indígenas de Roraima num intercâmbio com o Bem-Viver.

No segundo dia do encontro, as lideranças indígenas assistiram as palestras do veterinário e pesquisador da Embrapa Roraima Ramayana Menezes Braga, que apresentou as potencialidades do lavrado roraimense para a atividade pecuária, e da pesquisadora e especialista em produção e manejo animal Sandra Santos da Embrapa Pantanal, que frisou, principalmente, a importância do mapeamento do território produtivo para levantar os pontos positivos e negativos de cada região.

No último dia do evento as lideranças indígenas se dividiram em três grupos de acordo com suas etnorregiões (Surumu, Raposa e Serras) para identificar e enumerar os atuais problemas da pecuária nas comunidades, além de definir metas e ações que serão executadas nessas três localidades com apoio do projeto Bem-Viver.

Anselmo Dionísio Filho, coordenador da etnorregião Surumu da Raposa Serra do Sol, disse que o encontro foi essencial para retomar as discussões acerca da produção indígena. Em 2019, ele viajou ao MS com auxílio do projeto Bem-Viver para conhecer a pecuária da região e aprender técnicas de manejo que também podem ser desenvolvidas nas comunidades de Roraima. “Estou feliz porque aqui estamos tendo espaço para avançar nas nossas criações e produções”, resumiu Dionísio da etnia macuxi.

Nilo Batista André, coordenador do “Uma vaca para o índio” na Região das Serras também ressaltou que o evento foi importante para discutir metas e fortalecer a pecuária indígena. “Aprendi muitas coisas novas, principalmente a importância do manejo e não só do rebanho de gado e isso nos fortalece muito”, afirmou a liderança que também é da etnia macuxi.

Para Reinaldo Lourival, da ONG Nature and Culture International (NCI), o encontro foi um sucesso porque além de ter reunido o dobro do público esperado, também revelou o grande interesse das comunidades em participar ativamente da busca pelo bem viver dos povos indígenas de Roraima.

“Tivemos um público bastante interessante, composto de lideranças femininas, muitos jovens, além, é claro, das lideranças mais tradicionais. E assim nós conseguimos também trazer uma discussão fundamental que é o compromisso que essas comunidades têm com o bem viver não só dentro da Raposa Serra do Sol como também em muitas outras comunidades do estado”, finalizou.